quarta-feira, 30 de junho de 2010

Entre Joelhos, Canelas & Tornozelos, por Renato HELL Albasini


Enquanto o mundo se abaixa para ver a jabulani voar sobre suas cabeças, os seus mandantes brincam de quem vai pagar a conta da festa. Na terra dos Tupis Guaranis são votados para conceder benefícios dos 10% aos garçons e pessoas da cozinha com direitos adquiridos entre uma coxinha e outra e boas doses de cerveja. Donos tentam burlar as normas das portarias baixadas nas grades de seus estabelecimentos com os bufês devidamente limpos, com pratos e talheres embalados, redomas fechadas e aquecidas e refriadas, se for o caso, da mesa de alimentação.
E a Copa do Mundo continua. Ano de eleição e a maioria sequer tem ideia de quem são os candidatos. Mas o jogo continua. Qual será a escalação? O Dunga é burro ou apenas truculento?
E no final de semana juntamos um deseperados para bater uma bolinha sem darmos a menor pelota para o adversário do dia a dia. Eu por exemplo ainda me achando como um redentor atlético enfrento os rufiões com minha vontade, certa habilidade e muita disposição mantida às duras penas com exercícios diários. Outros já se dedicam com os seus avatares deixados nos butecos da noite anterior.
O que fazer? Jogar nossa bolinha de gude e se der quebrar as pernas de quem ainda não viu o tsunami logo ali. faça seu gol, mas esteja atento ao desvio da bola quando ela se dirigir ao seu rosto.
Entre Joelhos, Canelas & Tornozelos chegamos ao fim do mês. Alguém empresta R$ 10,00 reais para pagar a quadra?!

sábado, 19 de junho de 2010

UNO (SANNIO)


Verte-ia a noite inteira.

Esticaria infantilmente as pontas dos meus dedos, na essência perpendicular dos seus medos.

Na nudez da sua alma.

Na excelência do teu corpo.

Na malícia dos seus lábios. Que me fitam, sem terem olhos.Que encaram minha boca,sem terem íris.Sem terem pálpebras.

Sem terem noção do mal que me causam.

Do poço que abrem no meu peito.

Tocaria teu corpo.Como se meu fosse.

Como pudesse possuir,o que apenas venero.

Como pudesse consolar,o que me torna humano.

O que primitiva minha racionalidade.

No deslizar dos meus dedos,pelas suas costas.

Contaria um a um,os diminutos pêlos do teu corpo a arrepiarem.

Os gemidos a te calarem.

E minhas lágrimas ao despertar.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Medo da Chuva (Sannio)


"- Ela quer namorar!"- disse a melhor amiga, de uma quase namorada.


Eu gostava do "quase". O quase impedia o momentâneo de se tornar eterno. O que não havia acabado, de ser escrito. De ser publicado.


Acho que eu admiro o "quase” até hoje. Me trás uma sensação de liberdade. A falta de compromisso com outra pessoa. É tão bom!


Não é sempre que tenho esses pensamentos egoístas. Nem é sempre que me defendo das acusações que eu mesmo levanto contra mim.


Mas é quase sem querer que gostamos. Que eu gosto, ao menos. Que eu me "apego"! Como eu dizia antes. Antes de aprender a dividir um pouco.


As velhas aulas voltam às vezes. Às vezes, os velhos fantasmas também. E eu sigo fazendo merda!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

CALEIDOSCÓPIO, de RENATO Hell ALBASINI



Algumas horas se passaram e nem notei que o dia foi, lentamente, sumindo. É noite clara, tão clara como se todas as luzes estivessem sido acesas ao mesmo tempo. A lua parece uma face pálida, triste, distante e bela; uma sedutora cena de romance inatingível, intocável, muitas vezes ridículo que se formou no céu. Continuo a olhar o céu negro tão iluminado, profundo, pensativo e nesse instante acredito que posso dominar o Universo, que minhas mãos podem alcançar as estrelas que piscam incessantemente nesse véu escuro; que tenho poder, que sou o poder e não estou só.
Estou sentado à beira de uma sacada admirando o movimento da cidade ao meu redor como um espectador curioso, um voyer que se sacia no prazer da simples ação das pessoas ao longe, da simples existência da vida. A minha frente, diante de uma janela entreaberta, vejo um jovem casal discutindo, não ,conversando de maneira ríspida, quase agressiva. A mulher tem cerca de vinte e três anos e o homem não deve passar muito dessa idade. Com os olhos inchados, vermelhos (tão doces) e agitando muito os braços clama junto ao seu companheiro; ele, por sua vez, permanece de costas para ela, apenas dialoga com o nada. Ela veste uma camiseta branca e uma bermuda de jeans; ele, de camisa branca, calça de linho azul. Os rostos estão corados. Não consigo saber o que eles falam, tento permanecer mais atento e observar a cena. O homem, finalmente, se vira para a mulher que se encontrava em pé, bem a frente da janela entreaberta. Creio que a discussão tenha chegado ao fim. Ambos se abraçam, beijam-se, desesperadamente as roupas começam a serem jogadas para cima, peças se transformam em farrapos em milésimos de segundos. Diante daquela janela, eles se tornaram um corpo só. A beleza de seus movimentos e prazer que ambos tinham a cada exacerbação de desejo e fúria que aumentava violentamente, numa mistura de raiva e amor, de desculpas com ofensas, de saudades com despedidas, de um homem e uma mulher. Os observava, atento, até caírem em exaustação completa ao fim de um prazer conjunto e sincronizado. Sorrisos nas faces avermelhadas, o cheiro de suor e gozo espalhados pela noite chegam até a mim. Meu sangue ferve, o meu corpo treme. Preciso de ar. Resolvo ir para outro lugar, entro pela noite com o vento carinhoso banhando meu rosto, massageando meu cabelo, guiando meu corpo. Chego a uma rua de pouco movimento que fica paralela a uma barulhenta avenida. Com tráfego intenso de todos os lados, vejo bares e casas noturnas formando um cenário dantesco, assustador. Caminho entre as pessoas sem olhá-las em seus rostos. Olho para o chão fixamente sem nunca desviar o olhar. No ar, uma mistura de perfumes e cigarros, destilam odores das pessoas que falam alto como se todos fossem surdos; mas o que mais sinto é o cheiro da vida, do seu sabor, da sua força e virilidade.
As roupas das pessoas, em geral, não são tão diferentes das minhas. Mulheres e meninas - mulheres trajando pequenos vestidos pretos, jeans, generosos decotes, corpos à mostra; outras já optam por um vestir mais coloquial, com muitas cores, acessórios, estilos; enquanto, do outro lado os homens transitam pela elegância de trajes e blazers, camisas bonitas. A maioria fica centralizada em seu grupo, talvez eles se aceitem como clãs que admiram seus objetivos e depois dispersam-se, talvez. Ainda não levantei a cabeça para encará-los, mas os vejo, os sinto, os respeito, os desejo.
Ouço algumas mulheres falando algo sobre mim. São elogios eloqüentes e sensuais falando sobre a minha beleza. Acho engraçado e dou um resquício de risada quase imperceptível. Finalmente, paro e olho as mulheres que falavam. O movimento ao redor fica mais lento. Encarei uma por uma. Os seus olhos chocaram-se com os meus profundamente; mas eu fitei uma em especial. Uma mulher alta de vestido preto longo, não vi as formas salientes de sua lingerie - o desejo aumenta -, seus traços são delicados e agressivos, seu nariz levemente arrebitado, olhos castanhos, rosto suavemente arredondado, lábios carnudos, róseos quase avermelhados, esquia, serena, de cabelos castanhos, pele clara. Uma mistura bem dosada entre uma mulher e uma menina.
Ela evitou de me olhar, mas meus olhos não a deixaram fugir e a trouxeram para mim. A agitação ao redor parece congelada, tudo está muito lento, inexistente. Com passos lentos, eu me dirigi até ela. O caminho é bem maior do que o imaginado; ela não mudou mais o seu olhar. Mais próximo dela, senti sua respiração, a palpitação de seu peito acelerada, sua boca aos poucos abrindo-se e eu acabo num mergulho nos seus lábios. Um longo beijo que sorvi com um prazer descomunal. Meus olhos encheram-se de lágrimas, mas não as deixei escapar pelo meu rosto. Trocamos mais alguns beijos sem falar nenhuma palavra.
No meio daquela avenida ouvimos uma voz feminina que chamava um nome de mulher. - Luísa! Como um susto tudo ficou mais acelerado, as pessoas voltaram a ficar inaudíveis, os carros cruzando os dois lados da avenida, o vai e vem das pessoas, muitas gargalhadas. Olho para a mulher que eu beijava e ela parecia estar retornando de algum lugar, seus olhos pareciam estrelas, seu vestido retratava a noite, seu sorriso significava a luz. Ela soltou meus braços e foi levada por uma mulher para onde estavam outras. Eu continuava olhando-a profundamente e a vi explicando as suas amigas o que havia acontecido sem muita certeza.
O vento aumentou e aos meus ouvidos chegou um leve silvo. Imaginei que horas seriam. Saí caminhando entre as pessoas, não olhei para trás e nem procurei sentir o odor daqueles lábios que minutos antes estavam junto aos meus. Estava tremendo com vontade de ficar ali, mas tinha coisas para fazer. Assuntos de necessidade vital. Da minha própria essência.
Já não estou mais entre o burburinho daquele agito, corto a avenida e me dirijo para as ruas transversais. Paro por um instante e passo a minha língua entre os lábios. Sinto o seu gosto, um sabor adocicado que se transforma aos poucos em um gosto levemente salgado. “O gosto do prazer”, penso eu. Me lembro o que tenho que fazer, infelizmente. Sigo o vento, vou com ele. Preciso resolver isso, ninguém consegue fazer sempre as coisas certas, porquê eu seria esse mártir, então? - Fodam-se! Grito eu com raiva junto com a força do vento, que aumenta. O eco faz tudo girar; a noite fica mais escura, densa, pesada. Desejo. Essa é a palavra chave, agora. Tento buscar na pouca racionalidade que me resta, onde estive esta noite. Não consigo ter pensamentos mais claros. Meu brazer negro esvoaça pelo ar orquestrado pelo vento, que se tornou ruidoso por alguns breves instantes e ambos continuamos a busca, a procura, a caça, a penitência.
A zona de baixo meretrício da cidade está em polvorosa. É véspera de feriado. Muito movimento - mais movimento. Estou parado na porta de uma casa fechada, aparentemente deserta. A noite transforma as coisas e as pessoas. Na mesma rua onde a casa fechada está localizada existem cerca de dez estabelecimentos freqüentados, não necessariamente, por adultos que na sua maioria são homens ( mas também não é regra) e entre todas essas casas tem até uma igreja. Me lembro de alguém ter comentado que a igrejinha era “da Nossa Senhora do Putedo”, velha piada sem graça de gente que não respeita a si e os outros, muito menos a vida alheia. Cheguei e o vento acalmou-se. Caminhei pela calçada onde as prostitutas disputavam com os travestis um espaço e clientes. Assediado por todos os lados. Todos mostrando a “mercadoria”. C’est La Vie.
Com uma certa dificuldade, chego até uma boate. Na porta, retratos de mulheres muito bonitas trajando minúsculos biquínis estampavam a fachada, acima das fotografias alguns nomes proclamavam os shows de strip-tease e sexo ao vivo. Um homem de pele parda, grande, corpulento, com o nariz quebrado e uma cicatriz que marcava seu rosto da orelha até o seu lábio inferior, convidava-me a entrar no estabelecimento dizendo as promoções da noite. - Cervejinha a quatrinho, chefe. Shows com as melhores. Tu “vai” ver e “vai” gostar. Te garanto que hoje, tu não “vai” para casa sozinho. Se quiser tem até motelzinho aqui perto. Negocia com elas, vai. Depois dessa proposta tão “interessante”, eu entrei e fiquei pensando naquela conversa nojenta, onde as profissionais são tratadas que nem lixo, que nem um saco de carne vermelha e suculenta. “Droga! Quem sou eu para julgar alguém”, pensei indignado. Não sinto o vento aqui dentro. O ar é abafado, escuro, com luzes estroboscópicas piscando a todo o instante. Nem se parecem com as estrelas da noite. Vejo o cenário com algumas mulheres abraçadas em alguns homens rindo, mas não posso ouvi-los por causa da música estupidamente alta. Um pequeno palco que está sendo usado por uma mulher na realização de um strip-tease. Linda, sexy, desejável. Todos param e a olham. Começo a chamar a atenção também. Minha roupa e meu jeito. Tento me aproximar mais do canto escuro. Não consigo. Três mulheres se aproximam junto com um homem de terno branco e gravata verde. - Boa noite. Essas aqui são algumas meninas que gostariam de falar com o senhor. Que bom que o Sr. veio hoje. Diz o homem baixo, de bigode e careca. Sua voz é um sussurro. Ele abandona as mulheres a minha frente, que de imediato se sentam ao meu lado e começam a puxar assunto em meio a carícias pelo meu corpo. Não sinto prazer, agora. Não é o momento. Tenho algo a fazer e não seria aqui que eu mataria a minha paixão; não a paixão, não qualquer desejo. Talvez outra hora. Peço desculpas as mulheres e as digo que preciso ir embora. Entretanto, acabo brincando um pouco. Disse levaria uma delas comigo. Poderia levar as três, mas seria outro dia. As três mulheres iniciaram uma competição acirrada. Pedi que se beijassem; elas fizeram. Pedi que fosse com mais volúpia. Fizeram. Estava me divertindo. Mas reafirmei que naquela noite só queria uma. Observei a discussão que iniciara; a morena de cabelos curtos, a loira de cabelos crespos e longos, a mulata de cabelos longos. Todas lindas, belíssimas, de corpos modelados, despidas de valores morais e de mais roupas, deliciosamente bonitas de minissaias e biquínis . Eu acabo com a discussão dizendo que nenhuma delas iria comigo. Cansei daquele picadeiro. Depois da insistência de duas delas, a terceira que ficou em silêncio, foi-se. Beijei na boca das duas que ficaram e elas partiram para outras mesas. Olhei para a mulher que acabara de terminar o seu show onde todos ainda a admiravam. Ao sair do palco, ela sentiu os meus olhos a seguindo. Ela voltou-se, de roupão, veio caminhando na minha direção suavemente mal pisando no chão. Todos os olhos em nós. Ela abriu o roupão bem na minha frente e ficou nua, sentou-se à mesa. - Porquê você está me olhando tanto? - Você sabe! - Se importa se eu me sentar assim? - Não. De forma alguma. Mas temos que ir com calma. Quero você toda, não só uma parte que você mostra para todos. A minha maior arte é valorizar as pequenas coisas como a simplicidade. Tirar uma peça de roupa do corpo de uma mulher, deixando cair seus medos, receios e descobrir todos os caminhos. - Caminhos que você já conhece. - É, mas como toda mulher, sempre há algo a se descobrir. Algo para se querer mais. Mas temos que ir. Te espero. Vista-se! Ordenei. A mulher levantou-se abruptamente. Fechou seu roupão ainda sob os olhares de todos. Eu sorri. Um pensamento escrachado passou pela minha cabeça. Ela demorou cerca de meia - hora. Voltou, agora, vestida. - Melhor?! - Ótimo! Disse sorrindo. Vamos nos encontrar com os outros. Todos nos seguiam. Alguém tentou segurá-la pelo braço, mas foi rechaçado pela própria força dela que apertou sua mão até o homem ficar de joelhos. Ninguém se mexeu. Saímos da boate seguidos pelos olhos de todos que ali estavam. Ao cruzar à porta, o porteiro disse orgulhoso: - Viu só! Eu disse que a coisa era muito boa. - Tchau, Benê! Tem alguém lá dentro precisando de ajuda. Disse a mulher. - Tchau, Magda. E tchau, patrão. Vou lá jogar o vagabundo na rua.
O vento aumentou como nunca, quando caminhávamos em direção ao bairro iluminados pela lua que parecia sorrir e nos abençoar, como se isso fosse possível.
Já é muito tarde. Muito tarde para se fazer outras coisas, evitar tantas mais. Eu e Magda não trocamos sequer uma sílaba, nos comunicávamos apenas pela nossa respiração densa que ecoava no silêncio da cidade à noite. Rapidamente chegamos ao nosso destino, pelo menos daquela noite, a casa de Renê. Ele era um homem velho, bastante gordo, simpático, nos recebeu com um grande sorriso - sua marca registrada. A casa era enorme, uma verdadeira mansão localizada num bairro nobre da cidade. O anfitrião, sem referir-se a nenhum dos dois diretamente, apontou para a sala de estar. Entramos. Lá estavam os outros. Jean e Angelo, um casal bonito, eram modelos, gays que lideravam um ONG valorizando a liberdade de escolha sexual, Lena, uma intrigante mulher de cabeça raspada e geralmente, usando óculos escuros, que trabalhava como produtora de moda e fotógrafa e um rosto desconhecido, Soares, um convidado.
Reunidos à mesa da sala de jantar, fomos sendo recepcionados por cada um dos convivas, contudo nenhuma palavra era dita apenas acenos com a cabeça. O anfitrião acabou tomando para si a função de interlocutor, abriu as conversações perguntando a cada um como estavam. Com a exceção de Soares, todos respondiam monossilabicamente. O convidado bebeu de uma só vez o seu copo de whisky sem gelo, fez uma careta e iniciou seu falatório: - Não sei à respeito dos outros, mas gostaria de mais motivação nessa nossa reuniãozinha. Isso parece mais um funeral. Ninguém conversa, ninguém fala coisa nenhuma. Encheu seu copo de novo. - Renê, você que é o anfitrião, não sei muito bem porque fui convidado até a sua casa. Me diz qual é. Não o conhecia antes dessa tarde, quando você me abordou diante da cafeteria e em meio a conversas animadas, me convidaste para vir hoje, aqui. Sei lá porquê. Gostaria que me explicasse. Bebeu novamente num gole só. O anfitrião sorriu, levantou sua taça de água e disse: - Somos um clã, caríssimo amigo. Estamos reunidos, como sempre fazemos em todas noites, para confraternizar a nossa existência. Gostamos, como direi, de carne nova no nosso meio. - Isso aqui não é uma daquelas festas de sacanagens, não é? Perguntou rindo o convidado numa mistura de assustado e excitado encarando o beijo que o casal gay praticava a sua frente. - Não. Respondeu secamente, o já não tão simpático anfitrião. - Buscamos prazer. O clima de erotismo foi crescendo naquele recinto. Lena colocou um cd no aparelho de som e despiu-se de seu longo casaco de couro negro e ficou nua, começou a dançar e daí ajoelhou-se a frente de Renê, que também desnudou-se de sua camisa preta e de suas calças negras, e ela abocanhou o seu sexo. Soares parecia tonto, assustado, mordendo o lábio inferior, suava muito. Olhou para mim e Magda, então tentou chegar até onde estávamos, mas parou no meio do caminho quando a mulher despiu os seios e puxou o meu rosto junto ao seu peito. Ficou parado olhando para todos os lados. Quando percebeu uma mão segurou sua perna acariciando seu sexo.
O convidado era um homem de porte médio, beirando uns quarenta anos, casado ( devido a aliança), levemente calvo, barbudo, pesava uns oitenta quilos e vestia um traje marrom. Ele tentou manter-se frio diante daquela orgia, mas não conseguiu. Sentiu-se tonto percebeu que Lena abria sua calça fazedno sexo nele ao mesmo tempo em Renê. Lena sorriu olhando para ele quando ele gozou em sua boca que se transformou em sangue, ele não suportou. Caiu de joelhos com as pernas trêmulas. Renê apoiou-se sobre ele. Sua cabeça girava como um pião a cada gemido, a cada grito, a cada espasmo dos outros. Imaginou ter sido drogado ou algo do tipo.
Estávamos extasiados pelo prazer, pelo desejo. Queríamos dividi-lo com qualquer um que se aproximasse. Renê sentou-se nu ao lado do enfermo Soares, este tentou afastá-lo, mas não conseguiu. O anfitrião o abraçou como um filho e sorriu. Durante essa cena fraternal, eu fui até a janela e olhei a lua, que parecia avermelhada, rubra. As duas mulheres entrelaçavam-se em seus sexos ao lado de Angelo e Jean. O cheiro de suor e gozo estava de novo me cercando, precisava de ar, acabara de satisfazer o meu desejo, parar de ferver o meu sangue. Vi os casais e a cena de pai e filho. Urrei e o vento, furiosamente, abriu as janelas. Renê afastou-se do convidado e começou a vestir-se. Os outros gozavam ao mesmo tempo. Soares permanecia no chão imóvel. O sangue do convidado já corria pelo seu corpo. As luzes se apagaram e o silvo do vento, gradualmente, diminuiu.
A vida tem sabor, cheiro e forma. As pessoas não sabem apreciar a sua essência, temem por coisas tolas, não querem experimentar coisas novas, assustam-se com escolhas e não querem sofrer. Devem fazer o que lhe agrada. Pena que Soares não poderá mais escolher. Sua alma não poderá mais ter opções. E nem seu corpo. Uma respiração ofegante se faz presente no escuro. As luzes retornam. Um quadro simplório se instalara naquela sala. Lena, já vestida com seu longo casaco de couro, estava sentada ao lado de Angelo e Jean, que fumavam e conversavam alegremente também vestidos; Renê não se encontrava e, Magda examinava, cuidadosamente, seu bustiê. Soares tinha sumido. Eu, em pé diante da janela fechada, meditava. “Desejo”. O nosso anfitrião entrou esbaforido e disse-nos: - É tarde! Amanhã nos reuniremos de novo. Mesmo horário. Todos se levantaram e rumaram em direção à porta sem dizer uma palavra. Quando o último cruzou a saída, a porta às suas costas fechou-se. Estava amanhecendo, eu fora abandonado pelos outros que sumiram. Estou sozinho mais uma de tantas outras vezes. O Sol ao longe, acorda. Na minha boca jaz um gosto confuso, meio salgado, meio doce, levemente azedo, suave. Aquele vestido negro, longo, esquio, sem marcas - aquela mulher. As minhas recordações crescem cada vez mais. Luísa. Estou me atrasando, não posso perder tanto tempo. “O tempo não pára...” Cantarolei.
Começo a correr, o meu corpo dói, está cansado. Não consigo me mover de uma maneira tão ágil como antes, talvez seja por causa da lua. Eu sei porquê, mas e daí!?. Todos tentam sempre achar algum porquê de seus erros e defeitos, falhas e fugas. Tudo tem um maldito porquê, mesmo sem compreendê-lo. O vento está fraco, muito fraco; será um dia quente, ensolarado, sem nuvens. Estou chegando perto do meu abrigo, do meu lar, casa, segurança. Ao mesmo tempo que o Sol engrandece, eu entro em minha morada que tem janelas cerradas, nenhuma luz natural, quase uma escuridão total já destruída pela luminosidade que vem de fora. Preciso fazer uma ligação telefônica. O sinal fica repetitivo, está ocupado. Corpo dolorido, machucado. Caminho no falso escuro da sala, me jogo em cima do grande sofá branco. Um corpo negro nas nuvens, sempre foi assim que imaginei esse sofá, um pedaço do céu ao lado do Sol. “As mãos de Deus”, começo a rir - dificilmente eu consigo rir tanto em tão pouco tempo. Fecho os olhos querendo esquecer.
O dia passa igual, transita pelos minutos até fechar suas horas chegando o momento da noite dar o seu ar. Anoiteceu faz algum tempo, estou sentado à beira de um terraço olhando para cima, tentando procurar as estrelas que me fizeram companhia ontem, anteontem e assim por diante. Percebo ao redor um movimento de pessoas. “São os moradores”. Como se suspeitassem ( ou temessem ), não vão até o terraço daquela casa tão bonita. Sinto-me curioso sobre quem seria o proprietário, quais seriam suas manias e como ele agiria ao me ver aqui em cima. Fico em pé e ando alguns passos em direção à porta que separa os aposentos do terraço. Espero que me vejam. Permaneço alguns segundos diante dela que está fechada e começo a rir baixinho, mas o som corre pela noite fazendo um eco dando dimensões de uma gargalhada. Não consigo me mover, não vou para frente e nem recuo, continuo parado. Fico provocando. Finalmente, me livro dessa prisão ajudado pelo vento que se aproximara com intensidade. Vou para um outro lugar. Gosto de lugares altos, isolados, numa cidade isso é bastante difícil. Tento ir aos mais altos edifícios, chego a um enorme condomínio de classe média. Me dirijo até seu telhado. O movimento das ruas aliado com os dos transeuntes parece um mundo de formigas trabalhando estupidamente e sem nenhum sentido organizacional; quase um instinto animal movido pela sua necessidade de sobrevivência. Desço alguns andares e, sossegadamente, invado um apartamento vazio. Aparentemente, ninguém morava ali, não existiam móveis e nem utensílios, o reboco das paredes já estava gasto, o parquê, quebrado. Fico na janela, olho para fora tentando encontrar algum ponto de observação. Dou uma panorâmica e fixo a visão num apartamento do edifício ao lado. Numa sala muito bem iluminada, encontra-se uma mulher sentada diante de uma tela. Ela fica alguns longos minutos encarando o vazio alvo daquele quadro. Me intriga saber o que ela está pensando, quisera eu perguntá-la. A mulher estava vestida apenas com um longo camisão, sua gola não existia e sua abertura desnudava um dos ombros, nas suas costas um desenho de um cartoon americano dos Simpson’s, suas pernas nuas e levemente claras. Estremeci por inteiro. O desejo cresceu dentro de mim, me fez rodopiar os pensamentos em 180 graus. Em um instante aquela mulher era uma conhecida, já a tinha sentido, já saboreava o seu gosto, mergulhara na noite em seus braços. Ela virou-se para a janela e me viu, sua expressão foi de espanto, horror, luxúria, tesão mesmo - num piscar de olhos. Ficamos uma eternidade nos encarando. O vento surgiu do nada e soprou com ódio abrindo a janela do apartamento da mulher, explodindo as cortinas em seu rosto, ao mesmo tempo que eu caía num profundo sonhar.
Estou deitado no chão de uma viela, longe daquele edifício, longe daquele rosto. Procuro me orientar, me levanto devagar um pouco atordoado. Coço o meu queixo, sinto um cheiro peculiar, um aroma conhecido. Ando em direção as luzes e meu celular grita ecoando pela noite. “Eco, noite, desejo...”palavras que povoam pensamentos desconcertantes, sem sentido. - Alô?! - Onde você está? Estou te esperando faz um bom tempo. Não te vejo desde ontem. Uma voz feminina ressoa do outro lado do aparelho. Penso em quem seria, não reconheço de imediato, estou confuso. - Vamos nos ver hoje? Senão, vou sair. Intima a mulher. - Não sei. Respondo, confuso. O telefone fica mudo, a ligação termina. Sinto, agora, que sei quem é aquela mulher. “Sofia”.
Sento numa mesa de um bar de grande movimento, onde as pessoas cantarolam canções populares, pagodes, sambas de breque, músicas em geral. Ninguém se importa muito com a minha presença. Um atendente vem até a minha mesa e me pergunta o que eu quero. Pensei muito e decidi por uma cerveja. Foi-me entregue a bebida e servida em um copo. Fiquei olhando aquele líquido e o bebi calmamente. A cada gole um pensamento aflorava em minha cabeça, vinha à tona a mulher que falara comigo ao telefone: Sofia. Ela já foi minha companhia por muito tempo, tinha um temperamento forte, uma personalidade marcante, um desejo de vida latente e gritante, uma mulher morena de um metro e sessenta e cinco, cabelos curtos castanhos escuros, coxas roliças, musculosas, em seu corpo uma Fênix jazia como uma tatuagem na virilha. Conheço-a sim. Quisera nunca ter conhecido.
Peço uma segunda cerveja, meus pensamentos começam a chegar em blocos que esbarram em lembranças, em vontades, em alegrias, perdas. Olho para cima e vejo a noite clara sorrindo mais uma vez. Ofereço um brinde para sua plenitude. Não sei que horas são. Tenho algo a fazer. Pago pelas bebidas e vou embora caminhando com calma. Meu corpo dói. Estou numa rua deserta, não há vento, não há nenhum ruído, nem os insetos estão por perto. Não há cheiro de vida. Já pressinto algo. Uns três homens surgem na minha frente e gritam para que eu fique parado. Eles vêm na minha direção; um deles tem uma faca na mão esquerda, os outros dois estão com as mãos nuas. Se aproximam com uma lentidão inacreditável, em slow-motion, estão a alguns metros e, eu corro em sua direção como por instinto, nesses segundos fomos surpreendidos pela ventania que aparecera como por mágica. Não deixo eles tocarem em meu corpo, desarmo o primeiro e corto-lhe a garganta com sua própria faca abrindo-lhe todo o seu pescoço para o terror de seus comparsas. Banho minhas mãos de sangue quente, desejável e os fito com êxtase. Os dois afugentam-se pela noite e eu os alcanço através de meus pensamentos. Gritos cintilam entre as estrelas da noite clara, silenciosa ao mesmo tempo que são musicados pelo vento que agoniza até transformar-se numa brisa delicada. Os dois caídos. Derrotados. Mortos. Me viro para o corpo que se convulsionava no chão logo atrás; me aproximo.
Não gostaria de fazer a mesma coisa todos os dias, ter que defender uma essência idiota. Resolvo não ir até a mansão; já perdera muitas coisas nesse período de existência e o meu desejo já tem forma e sentido. O meu instinto pode ser controlado e até saciado por qualquer presa que eu quiser. Idiotices. Vou para uma rua não muito movimentada ( o tumulto me irrita ), aguardo qualquer coisa diferente acontecer escorado numa parede; estou na parte mais escura da rua, meio às sombras. Sinto fazer parte daquelas trevas; estou sozinho com pensamentos ao longe, imagino como as pessoas se mantém distantes. Desejo. Solidão. Argumento comigo mesmo as chances de tudo se modificar, das pessoas e das situações. Uma lágrima escorre pelo meu rosto como se treinada para isso. Ela parece cortar o seu caminho como se fizesse uma cicatriz. Ponho a mão perto do seu trajeto e o gosto salgado criva meus lábios, brinca com minha língua. Lembro-me de Luísa, dou um longo suspiro. Sussurro o seu nome para o vento. Sofia vem a minha mente como uma agulha que penetra fundo. A tela vazia. O telefone. Tocou frenéticamente, movimentando a sensação de incômodo dentro de mim. Do outro lado Renê me chamava. Nada disse. Não tenho mais nada a dizer, muito pouco a fazer e menos ainda para pensar. Estou distante comigo todo o tempo, perdido num labirinto de dúvidas e incertezas. De desejos.
A cidade fica muito mais interessante de cima, gosto de vê-la assim, parece um lugar bom e calmo para se viver, onde existem apenas pessoas sensatas, normais vivendo lado a lado e não essa verdadeira batalha campal que me deparo. As pessoas poderiam ser definidas como animais domesticados deles mesmos. Engraçado pensar nas pessoas. Porque não perco - meu contado - tempo comigo? É muita arrogância encarar a vida dos outros como um experiente conhecedor, se nem muito conheço a mim mesmo por inteiro. Ponho a mão direita na cabeça e meus dedos traspassam pelos fios dos meus cabelos, fazendo uma pequena massagem. Como será que as pessoas me enxergam? A minha altura, idade, beleza, feiúra, charme, boçalidade, como será? “Foda-se”, quem se importa. Quem quer se importar. Caminho, de novo, pelas ruas da cidade. Deve ser muito tarde mesmo para um feriado à noite. O silêncio é muito grande, sufocante até. Pode-se dizer que ele tem vida própria quando o sentimos assim tão suscetível ao nosso lado, um confidente passional e nem um pouco fiel.
Cheguei nas docas da cidade. Aqui é úmido, frio e fétido. Existe muita sujeira, nenhuma alma viva por perto. Resolvo sair dali, quero vida! Fui para o centro da cidade, encontrei movimento - aquele mesmo que tanto me irrita - e vi algumas pessoas transitando vertiginosamente de todos os lados possíveis. Sumi da vista deles. Me localizo numa marquise que adotei, prioritariamente, como um posto de observação para vê-los, julgá-los( que piada! ) e venerá-los.
Vários ônibus chegam a todo instante nas paradas e derramam uma grande quantidade de pessoas ao mesmo momento que recebe outras mais, numa troca parasitária de deveres e compromissos. Sede. Fome. Desejo. Quisera que esses repentes sumissem dentro de mim, não gostaria mais de machucar as pessoas, rezaria, se pudesse, aos deuses e pediria, não, imploraria que me libertasse dessa agonia, do afã esperado e odioso que brada sob minhas veias. Algo chama minha atenção. Um rebuliço, uma algazarra, pessoas correndo atrás de outras trazendo consigo faces de ira e alegria numa esquizofrenia generalizada. - Cuidado com o arrastão! Se ouve o grito do meio da multidão que corre em disparada. Miro um dos “caçadores” quando este fica mais atrás do seu grupo. Vou até ele, abordo-o com violência e sem muito hesitar carrego seu corpo para a entrada de uma galeria. O “caçador” é um jovem adolescente vestindo uma roupa esportiva e um boné. Ele me olha assustado e começa a chorar. Sinto pena, mas não complacência. Todos temos nossas sentenças, assim como o vento que retornara para junto de nós dois. O vento cessa; eu respiro ofegante, quase fraco e olho para o chão manchado de poças de vermelho escuro, esqueço do resto. Saio rápido, o mais rápido que consigo. Ouço um grito seguido de outros mais bem atrás de mim, não me volto para saber do que se trata, nem tenho algo a dizer à respeito - já não tenho mais nada a dizer, te lembras?!
Preciso de ar. Meu telefone está tocando de novo. Atendo logo quando paro numa praça, escuto um homem falando: - Está querendo provar o quê? Do que você está querendo se livrar? Venha, agora, para cá! Rugiu o homem do aparelho. Eu nem quis fazer a questão de saber quem era. Mesmo tendo reconhecido. Quero mais que me esqueça, desapareça dos meus olhos e, atualmente, dos meus ouvidos. Continuo precisando de ar. Minhas mãos têm cheiro de sangue, mas estão limpas e então, as ergo para cima tentando alcançar qualquer uma daquelas estrelas como se pudesse fazer um acordo com Deus. “Não sei porquê tenho que te pedir desculpas, jamais descobri se fiz algo tão errado para merecer isso tudo. Mas mesmo assim, eu peço”. Iniciei uma oração em silêncio que parecia estar reverberando entre as árvores. O céu ficou encoberto e começou uma chuva forte, mas passageira. Desconhecia que sabia rezar, tive medo quando o tempo modificou-se e a noite engoliu as estrelas colocando as nuvens pesadas sobre a cidade. Mas acabou tão rápido, quando como começou. Acreditei que aquele ato meteorológico não passava de uma resposta negativa aos meus pedidos. “Merda”, foi só o que eu quis dizer. Sabia que o tempo estava passando, já estava na hora de ir embora, sumir dali, chegar em casa e desistir da essência por essa noite, pelo menos por essa noite eu tinha que conseguir ser eu. Até agora só poderia culpar a mim mesmo. Não consegui ter a vida, só a morte como prêmio.
As ruas encharcadas armazenam grandes poças e andar pulando-as, driblando-as se tornou um desafio entediante. Quero ir embora, preciso chegar aos meus aposentos, passo por ruas, e outras avenidas, cruzo atalhos e não chego ao lugar final por eles de maneira mais rápida. Creio estar perdido, mas não sozinho. Na minha cabeça, as lembranças dissimulam os fatos marcantes. Sangue, gritos, vento, correria, suavidade, barulho, noite, Luísa, Sofia. Entrecortam-se às navalhadas diante dos meus olhos abertos, que nunca piscam. Preciso de ar. Estou ofegante, temo não conseguir chegar em casa. Sobrevivência.
Nunca tive tanto medo, tanto dessabor em não ter certeza de algo. Parece que vou explodir, meus pensamentos vão tomar formas físicas e ao verem meu corpo no chão, se reunirão para rirem a vontade. Tenho que chegar em casa. Abrigo. Segurança. Estou perto, pressinto. Tremo todo o corpo, mal firmo as mãos geladas e avermelhadas. Peço socorro a ninguém. A porta, finalmente. Estou em casa. Nas trevas conhecidas, na jaula. Respiro fundo e o ar não preenche meus pulmões. Quebro uma das janelas cerradas e vislumbro a noite. Encaro a lua e, ao baixar os olhos, vejo diante de mim, o edifício da artista pensativa com sua janela aberta. Sua figura não tarda a aparecer da mesma forma que antes, me olhando profundamente dentro dos meus olhos. O vento sopra áspero, e ela sorri fechando a janela lentamente. As luzes se apagam. Cambaleio para trás e caio em minha nuvem branca. Alcanço o telefone e digito vorazmente. Aguardo o sinal. Preciso de ar. A ligação não se completa, estava ocupada a linha. O nascer do Sol inicia-se e luzes começam entrar pela janela arrombada. Vejo as cores dos primeiros raios do Sol desenhando entre as paredes dos edifícios, vários formatos, muitas texturas. Estou com sono. Estou sozinho nas mãos de Deus.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

"Até as orquídeas tem ciúmes de mim!" (Sannio)‏


Não gosto quando as coisas ficam rápidas demais.


Não que eu não possa alcançá-las.


Eu só não gosto!


Ouvia Sinatra em mais uma noite fria em Porto Alegre.


Aquela voz... A "voz"!



Sentia uma devoção emotiva gigantesca naqueles minutos que a agulha rompia o silêncio entre uma canção e outra.


Um sentimento compartilhado pelos fãs (homens), do Chico Buarque.


Aquele envolvimento sentimentalóide (emo ao extremo).


"Se melar", achando que "se molhou", sabe?


Se você não entendeu, não dê bola...


Só os loucos sabem!




quarta-feira, 9 de junho de 2010

" A depressão do dedo anão " (Sannio)


Arrumei as malas. Juntei tudo que restou das roupas que cabiam melhor na pequena maleta encardida.


Olhei para a imagem no quadro.

" - Só por hoje!"


Molhei o pedaço de pão adormecido no café passado na noite anterior. Cocei a barba não feita e o saco nunca antes depilado.


Liguei para uma moça. Brigamos.


Liguei para outra. Menti. E continuamos de bem. Pelo menos até o próximo final de semana...



Olhei o quarto deserto. Depois olhei a sala deserta. Pensei em ligar para minha mãe. Mas eu gostava de chegar de surpresa. E era tarde demais para deixar de ser teimoso. Era tarde pra tanta coisa!


Praguejei assistindo um programa de tevê tosco. Peguei uma toalha semi seca no
varal. Me despi como me despedindo das velhas fantasias. Dos uniformes de sensatez e dos trajes da insanidade. Liguei o chuveiro. Bem quente!
Como um idiota feliz."- Bem quente!"


Ouvi o som dos pássaros próximos da janela. Ouvi os carros passando ao
longe. Na cúpula daquela mente entregue a si mesma. Tive silêncio. E copiosamente chorei!


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domingo, 6 de junho de 2010

Inércia ( Renato HELL Albasini )


RAPPEANDO!



Hoje é um dia de trabalho, de batente
Dia comum para pessoas comuns, gente,
Seguindo sempre em frente,
Buscando toda a sorte do mundo
No azar de estar aqui contra todos e tudo
E você fica parado sem dar bola para o que acontece,
Nenhuma atitude, nenhum manifesto,
É costume de povo de cabresto
Como fantoches indefesos
Tendo que se proteger nas trincheiras da periferia
Da classe média, em cada esquina,
Com quem proporciona a segurança na artilharia
Tentando manter sua família,
E a forma que eu posso me defender é na guerra das palavras, disparando idéias, metralhando opiniões,
Chega de disso ou daquilo,
De baixar a cabeça para toda essa incoerência,
Basta mesmo com toda essa indecência,
É o tipo prostituído de violência,
Alimentando quem tem poder com a nossa inadimplência,
E você ainda se preocupa em aumentar tudo isso,
Não importa a palavra que você use raiva, segregação, preconceito,
Vê se não vacila, sei que é um erro comum,
O princípio é dar um jeito,
Reconhecer que todos somos um,
Vê se não se engana,
Somos todos uma raça, a raça humana,
E o que importa para ti se sou um branco, negro, amarelo, azul, colorado,
Se partiu para essa idéia
Você já está errado,
Pode Ter certeza que você não é o alvo,
Mas um dia vai ser baleado
Por todas as esperanças
Criadas na tua infância
Nos braços da tua mãe chorando
De nossa senhora te segurando
Ensangüentado pela tua ignorância.
Se você acha que é só ficar parado fumando um beck
Fechando um outro baseado
Assistindo o Faustào
Você perdeu não só o tempo,
Mas a sua essência,
Não sabe onde começa o divertimento
E termina a inocência,
Não seja um cadáver marcado,
Com o destinatário certo,
De uma praga que está à solta,
Use pelo menos a camisinha
Coloque na sua consciência,
Você também está na mira
E de sua inconseqüência,
Proteste, manifeste, seja útil,
Não se largue, não abandone por um motivo fútil,
Seja como seu pai, teu irmão, um vizinho qualquer
Que saem cedo como trabalhadores inocentes,
Agradeça a Deus por hoje retornar para casa como mais um sobrevivente,

Fique em paz, seja capaz...

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O Insone, de Renato HELL Albasini


Eu entrei no ônibus alçando os dois degraus que me colocaram para dentro. No equilíbrio necessário para me apoiar entre o espaço mínimo. Já na catraca uma enorme fila se aglomerava. Pessoas com suas sacolas, mochilas e bolsas. Bem na hora do “rush”. Seis e meia da tarde, que se parecia com a noite tamanha a escuridão. Tinha a sensação que alguém colocara um pano preto por cima e que levantava o pano dando baforadas de cigarro saídas dos escapamentos dos veículos que trancavam as avenidas. Depois de uma travessia cheia de empurrões chego a um assento vazio que divido ao lado com um homem gordo.
Não demora muito e o ônibus enche a tal ponto que caminhar por ele é inviável nem por meio de empurrões. E uma ansiedade começa crescer dentro de mim. Que se transforma em fúria. Pessoas caindo por cima uma das outras. Por cima de mim. Começo a suar. E a ira que antes estava calada urge.
Ergo do assento e empurro as pessoas que estavam ao redor. Um grito ecoa revirando as cabeças de todos. Todos os olhares convergindo para mim. E antes que pudessem ter alguma outra reação das minhas costas explodem asas pontiagudas, minhas unhas tornam-se garras, cresço e meus músculos aumentam. Com golpes rápidos dilacero a maioria que estava bem perto. Com as asas arrebato outros. Da minha boca uma língua gigantesca enlaça pescoços e os torce. Continuo arrancando membros e com a boca cheia de sangue vocifero palavras de baixo calão. Abro espaço pintando a parte interna do ônibus de vermelho fechado. Os que tentavam em vão fugir por qualquer fresta eram rapidamente dominados e castigados com força e violência. Do lado de fora os espectadores, carros, transeuntes, olhavam horrorizados aquela chacina com o balançar do ônibus como fosse de brinquedo. Pensavam haver um animal solto. Do lado de dentro alguns ainda reagiam, mulheres cravavam unhas no meu corpo, no rosto, enquanto homens disparavam chutes, pontapés, socos, tapas, batiam com o que havia a mão.
Mesmo me ferindo só conseguiam afortunar minha fúria que ficava cada vez mais insana. Nada, ninguém era poupado.
E quando o ônibus estava se desmantelando como se fosse uma caixa de papelão sendo rasgada, no fundo do veículo uma luz intensa, forte, cegando a todos aparece indo na minha direção. Fecho e abro os olhos com a intensidade e aos poucos começo ver uma figura feminina. Ela era coroada pela luz. Não tinha asas. Estava nua. Na região dos seus seios e do seu sexo havia luzes mais intensas emanando. Parecia um Cristo na cruz. Ela flutua ao se aproximar. Toca no meu rosto, o ilumina. Sinto as minhas asas descolarem causando uma dor incomparável. As unhas afrouxam por si e caem. Minhas presas e a língua diminuem. Fico de joelhos. Ela se aproxima mais. Meu rosto colado em seus seios de luz. Choro. Fecho os olhos.
Acordo assustado. Corpo suado. Nu. Ereto. Olho as horas: nove horas. É dia pela luz que invade o quarto pela janela aberta. Abro os olhos com mais cuidado e vejo na minha frente uma mulher nua sentada. Sorrindo. Ela não diz nada. Eu, meio atordoado, pego o relógio e vejo o dia que nele marca. Ainda é véspera de feriado.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

"DIÁRIOS DE GUERRA" (por TOMMY WINE BEER)


Ah, se Porto Alegre é uma puta metida à besta (e não quer nada comigo), uma vez que sou sempre barrado e/ou excluído dos grandes eventos, conchavos e golpes!

Por outro lado, Ipanema, bairro da Zona Sul, é um travesti sifilítico e de pau ereto que não quer outra coisa senão “foder” comigo.

Aquele meu verso imortalizado no poema sobre Ipanema infelizmente ficou DATADO! Ipanema NÃO mais respira e inspira tédio.

Como diz o RIFÃO: o bagulho tá islâmico!

Há uma guerra civil aqui: PROLETÁRIOS VS. VAGABUNDOS DROGATIVOS. E a nossa ARISTOCRACIA, que tem entrada nas esferas de poder, assiste a tudo INERTE, em seus carros blindados enquanto seus seguranças armados até os dentes fazem o serviço sujo.

Claro, ainda existem homens honrados. Como um cidadão que me pediu 20 pilas, dias atrás, para o táxi, de modo que ele pudesse fazer um assalto na Zona Norte. Palavras do cidadão “mano tu ta achando que eu sou chinelo? Não, não vou roubar aqui na nossa quebrada!”.

Nem precisa dizer que eu não tenho lado nestes conflitos. Sou um mero REPÓRTER DE GUERRA.
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O PEQUENO BASTARDO (Sannio)





Atraído pelas calças, são meus tênis ainda que me levam.

Havia um coração no meio do caminho.

Não...

Não havia não!



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terça-feira, 1 de junho de 2010

FAMÍLIAéPROPRIEDADE, PÁTRIAéDESACATO! (por Tommy Wine Beer)


Minha mãe leu meus poemas e ficou impressionada com a línguagem que eu aprendi na faculdade de Direito. Acha que fui trocado no hospital.
Não sacou a ironia do lance, porra tem muita gente escrevendo bonitinho demais em blogs, falta um pouco de bobagem espontânea.Tá essa foi a única desculpa furada que eu consegui inventar.
Conselho: abram a caixa de texto e deixem a merda fluir...
Além do mais é uma forma de exorcizar o juridiquês de merda que tentaram me enfiar goela abaixo.
Daí então pensei um pouco sobre estes casos de trocas de bebês em hospitais. Uma confusão danada e troca e depois destroca.
Eu tenho minha opiniãozinha: Não trocava! Ficava com aquele mesmo.
Tem um senhor sábio e alcoólatra aqui do bairro que sempre repete 2 rifões que me agradam: o primeiro é "pai é quem cria"; já o segundo vem em complementação, cujo teor é "sou corno mas tenho mulher bonita". Esse véio é um filósofo estóico né!
Só que daí surgem os psicólogos. Falando em traumas! Traumático é o valor das consultas desses caras!
Que se dane o DNA! Meu filho e eu discordamos em quase tudo: eu sou ateu, vegetariano...; ele cristão, carnívoro...e somos, até que se prove o contrário, sangue do mesmo sangue.
E eu acho isso do caralho! Honestamente eu não queria que meu filho fosse uma versão 97 de mim!
Agora gremistão ele é! Mas não meti pilha, o moleque é safo sabe aritmética: 2 libertadores contra só uminha! Aritmética simples!
E tem mais: Mundial da FIFA um dia chegamos lá; agora taça Toyota que nós conquistamos em 83 eles nunca terão!
Também acho que esta história de “dar exemplo” é um papo bem furado.
Meus pais não gostam muito de ler, nem de esportes e muito menos do tipo de música que me agrada. Nem por isso assimilei seus hábitos por osmose. Leio, pelo menos o Zurzir mensalmente, e sou fominha por bola, e ouço uns veneninhos, modéstia à parte (vai crase?) bem loucos.
Portanto mijem no seu DNA! Traiam sua classe! Assoem o nariz na bandeira nacional se tiverem culhões!
É a idéia do João da Ega, personagem do Eça: “o desacato é a condição do progresso”. Maaaaaassa!


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