segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

"Um Sonho Qualquer" (Sannio)



Sentado, vi você se aproximar.
E você se sentou tão próxima.
Como costumava fazer antes.
Apesar, de tudo agora ter mudado.
Seu cumprimento rápido.
Meu ardil infeliz, na tentativa infantil de acariciar sua nuca por um instante.
- Oi, tudo bem?- disse ela.
- Tudo. Tudo bem, né? - respondi eu.
E me calei praguejando contra mim mesmo.
"Idiota!"
Eu tomava água.
Ela nada.
A mesma blusa laranja.
Eu, a mesma camiseta preta.
E não vi brilho em seus cachos. Todos ordenados (ou quase todos).
Presos em um coque.
"Gostava de ve-los soltos. A sós..."
Brinquei sobre a água ser cachaça.
Só pra ver um sorriso.
Ouvir uma risada curta.
Ser pedante.
E não ser notado por isto.
De todas as minhas tentativas frustradas.
A pior foi querer mostrar indiferença.
Mas habilmente, mostrei ao menos dignidade.
"Já era um começo!"
Seus olhos percorriam o meu rosto e a minha cabeça, como um parasita sanguinário, acostumado ao hospedeiro.
Conseguia enfim, atenção.
Uma atenção silenciosa e analítica.
E a beleza, sempre guardada para as despedidas.
Foi melancólica e afetuosa.
Quase familiar:
- Fica com Deus! - ela disse.
De que me adiantava ficar com Ele.
Se em minha cama, já não dormiam mais os anjos.

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