A noite já
chega com força sem avisar. Ele está no apartamento olhando para fora, nu,
senta-se na beirada da janela aberta. Dentro do recinto só a escuridão mais
profunda contrasta com a luz da rua, dos prédios à frente. Ele observa tudo
balançando as pernas. Eu fico olhando para ele, de pernas cruzadas em pé do
lado de fora do prédio. Coço o meu queixo, enquanto ele fica analisando as
janelas e também coça o saco, até parar o olhar num dos andares.
Uma das
janelas, uma mulher seminua, com seios à mostra, corpulenta, levemente fora do
peso, acima dos 40 anos, escolhe uma blusa. Desfila pelo quarto jogando para
cima peças e peças de roupa. Ele a observa e começa a se tocar. Masturba-se
como um chimpanzé no zoológico. Eu abaixo a cabeça e a maneio negativamente.
Ela acha uma blusa que lhe agrada e sai das vistas dele. Ele da uma pequena
arfada ao mesmo tempo emite um palavrão.
Ele se volta
para dentro do seu apartamento escuro e eu o sigo. Sabe aquela sensação de calafrios
que sente quando estamos sozinhos e temos a nítida impressão que não. Pois é,
ele sentiu isso. Eu sorrio baixinho. Ele para no meio do quarto olha para os
lados. Ouço claramente sua respiração forçada e os batimentos parecem aumentar
além da sua caixa torácica. Atrapalha-se e quase cai pisoteando os sapatos
jogados pelo chão. Vai até a janela e a fecha. Ele está no décimo andar. Passa de
um lado para outro e eu escorado no canto oposto.
Medo. Seria
uma boa palavra para o que ele está sentindo. E eu olho meu relógio. Está quase
na hora. Hora de apagar as velas de aniversários que já se passaram. Hora de
apagar com uma borracha frases ditas e escritas por aí. Hora de queimar as fotos
guardadas nas gavetas. Hora que demorou, para se aproximar e agora; a hora
chegou.
Ele senta-se
na cama. Eu, ao lado dele, também. O abraço e agora ele me vê. Chora e eu faço
um ar de agrado, de conforto. Um longo abraço. Suave, depois, o afasto. Seguro
seu rosto. Olho bem para seus olhos e ele choraminga tentando fazer a menção de
falar algo. Coloco meu dedo indicador direito nos lábios dele. Vejo que há
esperança no olhar dele. E nesse momento desfiro uma navalha na sua garganta
puxando para dentro da escuridão do seu quarto nos cantos onde nem ele
conhecia.
O quarto está
vazio. A noite iluminada. As pessoas continuam suas vidas.
Até a outra hora, pessoal...
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